Sindicato e Ordem dos Médicos contestam falta de orientação superior
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As consultas abertas, criadas pelos protocolos que o Ministério da Saúde assinou com algumas autarquias, arrancaram na região Norte a 27 de Abril. Mas os dirigentes médicos avisam que ninguém sabe ao certo o que é esta «nova» consulta e que as consequências desta indefinição podem ser «graves».
No aceso programa Prós e Contras, que em Março passado a RTP1 dedicou à reestruturação da rede nacional de Urgências, José Manuel Silva, presidente do Conselho Regional do Centro (CRC) da Ordem dos Médicos (OM), instou o ministro da Saúde a definir «consulta aberta». Correia de Campos desvalorizou a importância de tal acto, argumentando que os médicos nunca se preocuparam em definir o que era um SAP (serviço de atendimento permanente).
Polémicas à parte, o certo é que as consultas abertas, criadas no âmbito dos protocolos que o Ministério da Saúde assinou com alguns municípios, estão já a funcionar desde 27 de Abril, nomeadamente, nas regiões do Porto e de Bragança. Contudo, segundo estruturas do sector, as consequências de não se saber com exactidão em que consiste esta nova modalidade de consulta podem ser muitas e preocupantes.
Carlos Arroz, secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos (SIM), salienta que não existe enquadramento legal para a «nova» consulta. «Temos de saber o que é uma consulta aberta, até porque esta indefinição pode ter consequências laborais com alguma gravidade. Se estamos a falar de uma consulta, há períodos definidos para o tempo máximo em que os médicos podem trabalhar neste regime, se estamos a falar de uma Urgência, os períodos de trabalho são outros», explicou.
O sindicalista lembra que «o horário dos médicos não se alargou» e que, por isso, não é possível, em termos de legislação laboral, colocar um médico das 8 às 20 horas (ou às 22 horas, em alguns casos) a dar «consulta aberta». Na opinião de Carlos Arroz, esta solução encontrada pelo ministro Correia de Campos foi desenhada «em cima dos joelhos» e não é praticável. «Para os médicos estarem na consulta aberta vão ter que deixar de efectuar outras actividades no centro de saúde, ou seja, estamos a “destapar” algumas áreas para resolver o problema de protocolos, que não são exequíveis do ponto de vista laboral. O senhor ministro anda a vender o que não tem», frisou.
O SIM enviou já duas missivas à ARS Norte, solicitando esclarecimentos acerca das consultas abertas criadas ao abrigo dos protocolos estabelecidos com os municípios de Vila do Conde, Santo Tirso, Amarante e ainda com várias autarquias do distrito de Bragança. Mas, segundo o seu secretário-geral, até ao momento não recebeu qualquer resposta.
Algumas das perguntas que o SIM gostaria de ver respondidas são:
«O que é uma consulta aberta, a quem se destina e quem a assegura?
Nos dias úteis, o tempo que lhe é destinado faz parte do horário normal semanal de trabalho? Nos fins-de-semana e feriados é considerado como trabalho extraordinário?
Como é pago e compensado esse trabalho extraordinário?
Quais os recursos humanos médicos a ela alocados (…)?
Quais os tempos de duração do trabalho médico?
Há limite para o número de doentes atendidos, dado haver um termo para o seu funcionamento?».
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A consulta aberta e a «dessapização»
Estas questões são, aliás, semelhantes às que coloca José Manuel Silva.
«A consulta aberta é apenas uma consulta de esferográfica e estetoscópio», ou pode-se «administrar, por exemplo, um soro? O médico que a faz pode tratar uma crise hipertensiva ou deve mandar para a Urgência?», indaga o dirigente da Ordem dos Médicos.
Para o professor de Coimbra, a definição do que é uma consulta aberta é essencial, não só para os médicos que nela trabalham, mas também para os doentes, o INEM e até para o novo serviço Saúde 24.
«Não se pode andar a brincar com os recursos. As pessoas têm de saber com o que podem contar e os médicos têm de saber quais são as suas obrigações», defendeu.
Segundo o presidente do CRC, as consequências da indefinição vigente já se estão a sentir, pois cada centro de saúde «faz o que quer». Há uns «que mantêm a consulta aberta no espaço do antigo SAP e com o mesmo tipo de resposta. Há outros que até lhe chamam consulta aberta para situações de urgência», contou.
José Manuel Silva diz que o Ministério da Saúde se comprometeu a apresentar um regulamento das consultas abertas, mas até ao momento não chegou à Ordem dos Médicos qualquer documento. O CRC fez uma solicitação, por escrito, no mesmo sentido à ARS do Centro, «há meses», mas também não obteve resposta até à data.
O Gabinete do Ministro da Saúde, pela voz da sua assessora de Imprensa, disse, contudo, que «cabe aos serviços regionais definir, em conjunto com os centros de saúde, como vão funcionar essas consultas».
«TM», contactou também Luís Pisco, coordenador da Missão para os Cuidados de Saúde Primários, que se escusou a falar sobre o assunto, argumentando que esta é uma proposta da comissão técnica que estudou a reestruturação das Urgências.
Maria F. Teixeira...
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A definição possível
A informação mais completa acerca do que é uma consulta aberta é a dada pela Comissão Técnica de Apoio ao Processo de Requalificação das Urgências, nos documentos de clarificação que tornou públicos após a contestação verificada à sua proposta.
Num texto de 21 de Fevereiro lê-se que «existem muitas outras situações, agudas (ou seja, com aparecimento recente), que não sendo urgências nem emergências, carecem de resolução rápida (no mesmo dia ou em horas) em consulta aberta para situações não programadas (sem marcação prévia)». E, num outro documento, aquela comissão esclarece que «para a consulta aberta não programada, aceita-se que se centralize um ponto de apoio médico em determinado local, com recursos a meios do hospital ou dos cuidados primários»
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Texto integral da carta do SIM enviada ao presidente da ARS do Norte, em 27 de Abril de 2007:
Assunto: Reorganização dos Serviços Atendimento a Situações Urgentes (SASU) no Distrito do Porto - Protocolos Autarquias (Vila do Conde, Santo Tirso, Amarante) - Consulta Aberta
Na sequência da anunciada reorganização dos Serviços de Urgência, foi reportada pela Comunicação Social a assinatura, no distrito do Porto, de Protocolos entre o Ministério da Saúde e os Municípios de Vila do Conde, Santo Tirso e Amarante, locais onde funcionavam, a nível dos CSP, os Serviços de Atendimento a Situações Urgentes (SASU) até ao passado dia 24 de Abril.
A leitura dos mesmos, tal como divulgados pela Comunicação Social, e reportando-nos meramente a aspectos laborais e do foro sindical, leva-nos a solicitar a V. Ex.ª alguns esclarecimentos necessários para uma informação correcta aos nossos associados, e convenientes para uma tomada de posição oficial do Sindicato Independente dos Médicos sobre esta questão. Tanto mais que, até á data, parece estar a ser seguida também a este nível uma das Leis de Murphy (Só conseguimos prever as coisas depois de elas terem acontecido) de resultados imprevisíveis e que, como tal, nos preocupa.
Assim:
1º Quando é referido, e reportando-nos ao Protocolo respectivo, que “os centros de saúde de Vila do Conde/ Modivas e da Póvoa do Varzim, e a Unidade de Saúde das Caxinas, da área de influência do Centro Hospitalar Póvoa do Varzim/Vila do Conde, asseguram a sua actividade, designadamente a “consulta aberta” para dar resposta aos casos agudos não programáveis, das 08h00 às 22h00, todos os dias úteis, e das 08h00 às 20h00 aos fins-de-semana e feriados”., algumas questões se colocam e nomeadamente:
1. O que é uma Consulta Aberta, a quem se destina e quem a assegura?
2. Nos dias úteis, o tempo que lhe é destinado faz parte do horário normal semanal de trabalho?
3. Nos fins-de-semana e feriados é considerado como trabalho extraordinário?
4. Como é pago e compensado esse trabalho extraordinário?
5. Quais os recursos humanos médicos a ela alocados, em termos quantitativos e qualitativos, tendo até em conta a vigente organização de horários e de trabalho médico há muito implementados nos Centros de Saúde no Distrito do Porto, e nomeadamente as Consultas de Recurso/Reforço?
6. Quais os tempos de duração do trabalho médico?
7. Há limite para o número de doentes atendidos, dado haver um termo para o seu funcionamento?
8. Estão todos estes aspectos, e eventualmente outros, plasmados em Regulamento próprio?
9. Como está a ARS Norte a perspectivar neste caso a aplicação da legislação em vigor, nomeadamente os DL 73/90, 6.III, Despacho MS 18/90, 21.VIII, Despacho MS 17/90, 22.VIII, DL 259/98, 18.VIII, DL 44/2007, 23.II?
2º Ainda no mesmo Protocolo é referido que “A Unidade Hospitalar de Vila do Conde acomodará nas suas actuais instalações da urgência um atendimento não programado para casos agudos do foro ambulatório, sob a responsabilidade integral dos cuidados de saúde primários, em horário alargado das 08h00 às 24h00, com acesso aos sistemas de informação do centro de saúde e aos meios complementares de diagnóstico do hospital, nomeadamente imagiologia e testes laboratoriais”, ainda outras questões se colocam e nomeadamente:
1. Têm os Centros de Saúde (Vila do Conde/Modivas e Póvoa) recursos humanos médicos para assegurar um atendimento desse tipo sob a sua integral responsabilidade, quando está provado não existirem sequer para possibilitar um Médico de Família a toda a população?
2. Como está a ARS Norte a perspectivar, também nesta questão, a aplicação da legislação em vigor, nomeadamente os DL 73/90, 6.III, Despacho MS 18/90, 21.VIII, Despacho MS 17/90, 22.VIII, DL 259/98, 18.VIII, DL 44/2007, 23.II?
3. Refira-se que atempadamente, e a propósito de cláusula similar vertida noutros Protocolos com outras Autarquias, o Departamento Jurídico do Sindicato Independente dos Médicos elaborou competente parecer sobre esta questão, parecer esse que poderemos disponibilizar a V. Ex.ª caso o entenda como útil.
3º Questões do mesmo âmbito se poderão igualmente colocar relativamente a Santo Tirso e a Amarante, neste último caso com a agravante de à área de influência hospitalar pertencerem dois Centros de Saúde marcados pela interioridade e pela falta de recursos humanos: Marco de Canavezes e Baião.
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Texto integral da carta do SIM enviada ao presidente da ARS do Norte, em 16 de Abril de 2007:
Assunto: Reorganização dos serviços de atendimento urgente / SAP no Distrito de Bragança
Na sequência da anunciada reorganização dos Serviços de Atendimento Permanente (SAP), tem sido reportada pela Comunicação Social a assinatura de Protocolos entre o Ministério da Saúde e os Municípios, no caso mais recente os do Distrito de Bragança.
A leitura dos mesmos, e reportando-nos meramente a aspectos laborais e do foro sindical, leva-nos a solicitar a V. Ex.ª, e com carácter de urgência, alguns esclarecimentos, convenientes para uma tomada oficial de posição do Sindicato Independente dos Médicos e uma informação correcta aos nossos associados.
Assim:
1º Quando é referido que “encerram em todos os centros de saúde os serviços de atendimento permanente (SAP), que passam a ser substituídos por uma consulta aberta das 08h00 às 22h00 e ao fim-de-semana das 08h00 às 20h00”., algumas questões se colocam e nomeadamente:
1. O que é uma Consulta Aberta, a quem se destina e quem a assegura?
2. Nos dias úteis, o tempo que lhe é destinado faz parte do horário normal semanal de trabalho?
3. Nos fins-de-semana é considerado como trabalho extraordinário?
4. E nos dias feriados?
5. Como é pago e compensado esse trabalho extraordinário?
6. Quais os recursos humanos médicos a ela alocados, em termos quantitativos e qualitativos?
7. Quais os tempos de duração do trabalho médico?
8. Há limite para o número de doentes atendidos, dado haver um termo para o seu funcionamento?
9. Estão todos estes aspectos, e eventualmente outros, plasmados em Regulamento próprio?
10. Como está a ARS Norte a perspectivar neste caso a aplicação da legislação em vigor, nomeadamente os DL 73/90, 6.III, Despacho MS 18/90, 21.VIII, Despacho MS 17/90, 22.VIII, DL 259/98, 18.VIII, DL 44/2007, 23.II?
2º Quando é referido que “No período da noite, o ministro oferece como alternativa um enfermeiro em permanência no centro de saúde e um médico disponível à chamada telefónica”, supomos estar aqui em questão o regime de trabalho em prevenção.
Questão curial, a deixar bem esclarecida, é se foi já obtido, e em que termos, o acordo prévio do(s)médicos para esse regime de trabalho e consoante o determina o regime legal.
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TM 1.º CADERNO de 2007.05.070712431C02107MF18C