Pedro Gomes, coordenador do SIGIC, está confiante
Objectivo será alcançado «até ao final do ano»
Pedro Gomes é, desde 2004, o coordenador do SIGIC. Ao «TM», o cirurgião explicou como funcionam os «bastidores» da gestão das listas de espera cirúrgicas e como a sua equipa pretende alcançar, em 2008, a meta de não ter doentes prioritários à espera mais de quatro meses.
Pedro Gomes, médico do IPO de Lisboa, coordena o Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC) quase desde a sua fase inicial. Foi o anterior ministro da Saúde, Luís Filipe Pereira, quem o convidou para ficar à frente do projecto, quando decidiu lançar as primeiras experiências-piloto, no Algarve e no Alentejo.
Hoje, o responsável dá continuidade ao SIGIC que, sublinha, tem neste aspecto a sua grande mais-valia em relação aos demais programas de combate às listas de espera. «A grande diferença foi perceber-se que os programas anteriores resolviam os problemas quando estavam em curso, mas assim que acabavam o problema ressurgia e, portanto, era preciso encontrar uma solução mais definitiva, que alterasse estruturalmente o sistema», explicou Pedro Gomes. E, para o responsável, a inversão da tendência de crescimento do tempo de espera e do número de inscritos na lista evidencia o sucesso do SIGIC.
Actualmente, o sistema tenta recolher informação com vista à criação de indicadores que permitam melhorar a actuação, das instituições e dos próprios decisores políticos. Mas o coordenador sublinha que não se trata de uma mudança de orientação do projecto. «O que estamos a fazer é dar continuidade ao investimento nas ferramentas informáticas que foram adquiridas em 2004 e 2005. Não há mudança de linha no projecto, o que há é uma postura, desta administração, de reforço e de empenhamento na importância desse projecto, no sentido de que tenha um impacte mais célere e mais eficaz», afirmou, a propósito do investimento de 2,5 milhões de euros que a tutela decidiu fazer no SIGIC.
O «aperfeiçoamento» da aplicação informática que gere as listas de espera só estará concluído em 2008. Nessa altura, o sistema será capaz de emitir, de forma automática, alertas quando ocorrer algum movimento anormal ou excesso de tempo de espera, num determinado hospital ou mesmo num serviço. O objectivo, sublinha Pedro Gomes, é não só corrigir uma falha técnica ou o que está mal nos serviços, mas também «premiar os que cumprem».
Oncologia e Cardiologia são prioridades
Entretanto, o coordenador acredita que até ao final do ano será possível atingir o objectivo traçado: não ter doentes prioritários em lista mais de quatro meses, doentes oncológicos à espera há mais de dois meses e, finalmente, doentes não prioritários a aguardar há mais de um ano. Segundo o responsável, «não há hospitais sem capacidade para tratar os casos muito prioritários», uma vez que correspondem a uma percentagem muito pequena de doentes, mas ainda há doentes, inscritos na lista de espera cirúrgica com a indicação de prioritário feita pelo médico, a que as instituições que os receberam não são capazes de dar resposta. Segundo os dados fornecidos por Pedro Gomes, os utentes prioritários representam 8% do total de doentes inscritos (são 17 523), mas, destes, mais de metade (9606) aguarda por uma cirurgia há mais de dois meses.
No entanto, a transferência do doente para uma instituição privada que o possa operar não é feita logo aos dois meses, até porque os privados que detêm convenções com o Estado neste âmbito estão no limiar da sua capacidade de resposta. Além disso, há áreas em que a resposta dos privados é diminuta, nomeadamente no tratamento de doentes agudos que necessitam de cuidados mais diferenciados, e, por isso, revelou o coordenador, recentemente a secretária de Estado Adjunta e da Saúde deu indicações para que a tabela de preços de algumas áreas «críticas» seja revista de modo a tornar os preços «mais atractivos».
Um dos campos em que isso acontece é o da Oncologia, pelo que o SIGIC tentará dar especial atenção a estes casos. «Inicialmente, o programa estava sobretudo vocacionado para doentes que se encontravam há muito tempo em espera», explicou. Este problema está quase «resolvido» e, em 2007, a preocupação é dar resposta aos portadores de doenças graves para os quais a cirurgia, o mais rapidamente possível, é crucial. O Programa de Orientação de Doentes do Foro Cardiotorácico é um «bom exemplo», uma vez que está a funcionar «exclusivamente na rede pública» e com «100% de eficácia», tendo conseguido que todas as situações deste tipo sejam «atempadamente» resolvidas.
Um programa similar está a ser aplicado à Oncologia, mas devido quer ao volume quer à diversidade de patologias, o problema ainda não está «controlado» e a resposta é ainda «insuficiente», reconhece Pedro Gomes. Actualmente, em média, um doente oncológico espera três meses para ser operado e algumas áreas, como a da Cirurgia da cabeça e do pescoço, estão particularmente congestionadas. Por isso, o especialista em Cirurgia oncológica está empenhado em que «nenhum doente com cancro espere mais do que dois meses por uma cirurgia e, tendencialmente, até espere menos», e acredita que isso será possível. «Numa doença que representa, em termos de esforço cirúrgico, apenas 8% do esforço global, não há razão nenhuma para que o SNS não dê uma resposta satisfatória ou até acima do satisfatório», sublinhou.
Maria F. Teixeira
...CAIXA...
Os resultados em números
Desde 2005 até 31 de Março passado, o número de doentes à espera de uma cirurgia passou de 241 425 para 222 094, o que equivale a uma redução de 8%. Pedro Gomes diz que parece pouco, mas na verdade a redução é significativa, uma vez que na prática traduz a agilização da «máquina cirúrgica» do País que, frisa, «não é assim tão deficitária». O objectivo é ter 178 mil utentes em lista, para que se possam cumprir as metas traçadas, em termos de tempos de espera. Actualmente, a mediana do tempo de espera é 5,97 meses.
...CAIXA...
Disparidade regional
Se a situação não é famosa em todo o País, quando olhamos para as várias regiões verificamos que algumas apresentam uma realidade particularmente desfavorável. No que respeita ao número de doentes em lista de espera cirúrgica há mais de seis meses, dos 110 mil inscritos mais de 42 700 encontram-se na região de Lisboa e Vale do Tejo e cerca de 33 500 no Centro do País; o Norte também apresenta uma lista relativamente extensa neste campo, que ascende aos 28 mil inscritos.
No que toca aos doentes prioritários em lista, a nota negativa vai para o Algarve, que engloba 68% de utentes à espera de cirurgia há mais de dois meses. Segue-se, na «lista negra», a região de Lisboa, com 64%, e o Alentejo, com 58% dos doentes prioritários com muito tempo de espera.
Quando consideramos apenas o número de inscritos para cirurgia, no seu todo, a situação é particularmente preocupante na região de Lisboa e Vale do Tejo (74 488) e no Norte (onde se encontram 70 538 dos 222 094 doentes em lista). Estes dados, relativos a finais de Março passado, revelam contudo que são também as regiões com listas mais extensas as que mais doentes têm operado. Este ano, a região Norte intervencionou 32 mil doentes, a região de Lisboa e Vale do Tejo 29 mil e o Centro 23 800. O responsável destaca, aliás, a evolução muito favorável da região nortenha, que «abraçou o SIGIC como uma oportunidade».
Para Pedro Gomes, estas assimetrias regionais tem a ver com a forma como tem ocorrido a organização dos recursos em Saúde e sobretudo com o planeamento. «A organização dos recursos em Saúde tem vindo a ser feita de uma forma pró-activa, mas que decorre da autonomia das próprias instituições. No início era um pouco o crescimento individual das organizações que ia fazendo a resposta à sua procura e o planeamento central era muito deficitário, só nos últimos anos tem havido a procura de uma planeamento central, que permita planear os recursos de acordo com a distribuição das necessidades», explicou.
...CAIXA...
Vales-cirurgia
A emissão de vales-cirurgia para os doentes à espera há demasiado tempo foi uma «invenção» do anterior responsável da pasta da Saúde, mas a que esta equipa ministerial tem dado mais fôlego. Enquanto em 2004 foram emitidos 427 vales para que os utentes pudessem recorrer aos privados para resolver a sua situação, em 2005 foram atribuídos 11 587 vales e em 2006 chegou-se aos 64 mil. «Este número tem crescido muitíssimo», frisou Pedro Gomes. Ao todo, foram emitidos, até 31 de Março, 118 046 vales-cirurgia, 35 mil dos quais foram já accionados.
Ao abrigo deste programa, foram operados até agora mais de 24 mil doentes. Contudo, 37 mil vales não chegaram a ser usados. O coordenador não considera anormal este número, lembrando que tal corresponde a um conjunto de doentes que, por exemplo, encontraram solução para o seu problema recorrendo ao privado, foram operados de urgência ou, entretanto, não podem ser operados por terem desenvolvido outra patologia.
Se, no futuro, o combate às listas de espera vai continuar a centrar-se muito no sector privado convencionado, o coordenador não sabe, mas avisa que isso dependerá sobretudo da capacidade do sector público, que, apesar de receber mais ao abrigo deste programa do que os privados, realizou, em 2006, 655 cirurgias por transferência de doentes entre hospitais do SNS. «Há alguns hospitais públicos que se têm empenhado num crescendo de resposta a esta demanda», reconhece Pedro Gomes, que sublinha o aumento da capacidade de resposta do sector público.
No futuro, só a competição irá estabelecer o equilíbrio entre os sectores público e privado, mas as projecções do coordenador do SIGIC apontam para que já no final do primeiro semestre de 2008 seja possível que a maioria das cirurgias de resposta às listas de espera seja feita sobretudo no sector público. «Comportando-se como se comportam os sectores público e privado, a projecção na fase de equilíbrio — em que não haverá crescimento da lista de espera, não haverá doentes com mais de um ano em espera, doentes prioritários com mais de quatro meses de espera e doentes oncológicos à espera há mais de dois meses, uma meta que estabelecemos para o ano de 2008 —, é que com 10% a 12% de actividade cirúrgica em entidades convencionadas conseguiremos dar resposta», disse.
...CAIXA...
Um olhar à distância
Já quanto ao empenho da anterior equipa ministerial nas listas de espera, o coordenador disse que «é sempre possível fazer mais em qualquer instante, dependendo dos recursos que são alocados», mas também lembrou que naquela altura foi preciso vencer os velhos hábitos hospitalares. «Para os hospitais havia, de um lado, a informação administrativa e, do outro, a informação clínica, que os médicos, enfermeiros e auxiliares de enfermagem usavam para trabalhar. Este foi o primeiro hábito que tivemos que romper, fazendo-os perceber que estamos todos a falar do mesmo, mas este processo de aculturação leva tempo», contou.
Depois das experiências-piloto, o sistema foi estendido a todos os hospitais do País em 2005. Para tal, foi preciso formar e dar aos hospitais a ferramenta informática necessária para operar com o sistema. Por isso, 2006 foi ainda, nas palavras de Pedro Gomes, uma «fase de aprendizagem».
...CAIXA...
O tempo clinicamente aceitável e o tempo máximo de espera
Há alguns meses, a secretária de Estado Adjunta e da Saúde, Carmen Pignatelli, veio anunciar que iriam ser estabelecidos os tempos de espera clinicamente aceitáveis por patologia, um trabalho que estaria a ser feito com a colaboração da Ordem dos Médicos. Mas, pouco depois, o bastonário, Pedro Nunes, viria a contrariar a governante, dizendo que não é possível definir esses tempos, uma vez que só olhando caso a caso tal se pode aferir com precisão.
Talvez por isso Pedro Gomes prefira falar em «tempos máximos de espera», quando aplicados ao SIGIC, o que, garante, é um conceito diferente. «Quem define o tempo clinicamente aceitável para cada doente é o médico», afirmou. Por essa razão, o SIGIC apenas dá orientações que o clínico deve ter em conta na sua decisão, como seja a patologia ou o contexto social do doente. Mas «não é, na minha opinião, possível estabelecer critérios rígidos», reconhece o responsável.
...CAIXA...
O efeito terapêutico da divulgação dos resultados
Em 2008, o coordenador do SIGIC espera que o sistema informático já permita recolher, de forma assídua, dados que posteriormente possibilitem a divulgação e publicação dos resultados das várias regiões e até dos diferentes hospitais. E, na sua opinião, tal terá um efeito muito positivo: «estou convicto de que, à medida que tornarmos os dados mais transparentes, as próprias instituições terão uma outra pressão para dar uma resposta em que se revejam e de que se sintam orgulhosas».
Actualmente, cada hospital tem acesso aos seus dados, em média de três em três meses. De futuro, a ideia é que essa informação possa ser reportada às instituições «semana a semana».
...CAIXA...
Consultas externas em espera
As extensas listas de espera para consultas da especialidade são outra realidade. Pedro Gomes explicou que, para já, a gestão deste problema está a ser feita por uma equipa própria, ao nível do Ministério da Saúde e sob a coordenação de Carmen Pignatelli. Se, no futuro, a gestão destas duas listas de espera vai ser conjunta, o coordenador não sabe, sublinhando que isso é uma decisão política. Mas reconhece que seria útil que o SIGIC tivesse uma intervenção mais abrangente. «Há aqui uma correlação importante que queríamos estabelecer, uma vez que neste momento conhecemos os tempos de espera entre a proposta cirúrgica e o tratamento, mas gostaríamos de poder trabalhar os tempos de espera entre a requisição pelo médico de família e o tratamento, de modo a perceber quanto tempo o doente ficou à espera da consulta que lhe dá acesso à cirurgia», defendeu.
TM 1.º CADERNO de 2007.05.21
0712451C02107MF20c
que raio de saúde a nossa
Arquivo do blogue
-
▼
2007
(25)
-
▼
maio
(7)
- “FLEXIGURANÇA” NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, 1º PASSO ...
- SMZS considera o Instituto Gama Pinto em risco
- Octávio Cunha sobre fecho de maternidades
- SIGIC - Objectivo será alcançado «até ao final do ...
- Carlos Silva Santos é candidato a Bastonário da Or...
- Michael Porter e Correia de Campos
- A (in)definição da consulta aberta
-
▼
maio
(7)